A prolixidade de Malick e a psicanálise de Lars Von Trier

11
7

Há cerca de um ano, alguns dos principais jornais do país, em seus suplementos de cultura, levantaram a discussão sobre o provável fim do cinema de autor do cinema contemporâneo. Ainda que contasse com alguns bons argumentos, acompanhei a discussão com certa descrença. O cinema americano sim está em crise, não o cinema de autor como um todo. Todos os anos, e de várias partes do globo, são despejados centenas de filmes com suas ambições artísticas, políticas e/ou discursivas. O cinema filipino (na conjuntura atual) que o diga… Tudo isso para falar de dois filmes de fortes acentos autorais que vêm movimento o circuito cinematográfico atual: Melancolia, de Lars Von Trier e A Árvore da Vida de Terence Malick.

O filme de Malick trafega por fortíssimas linhas filosóficas e experimentais ao traçar o cotidiano (um tanto poético) de uma família texana na década de 50. O cineasta, que é conhecido pelo excesso de preciosismo em suas raras obras, nos últimos 30 anos, faz um filme de contemplação sob as leis discursivas do filósofo Heidegger, buscando traçar justificativas existenciais do homem em meio a imensidão da natureza. Não à toa, exibe imagens do sistema solar e até de dinossauros. Não levanta questionamentos para tal (e nem creio ser essa uma obrigação!), mas também ao permear sobre o “tema” acaba se traindo no excesso de prolixidade. Isso é tão claro que o miolo do filme, que compreende as relações humanas da tal família com a reverberação dos instintos infantis, é de uma grandeza (e pura cinefilia) invejável. O que contrasta com o prólogo e o epílogo que soam pretensiosos e disléxicos demais na generalidade do que se propõe.

Em suas abstrações estéticas, Malick foi muito mais feliz e eficiente no melhor filme de guerra já feito: Além da Linha Vermelha.
Melancolia, por outro lado, é uma interessantíssima metáfora psicanalítica também sobre o existencialismo do homem no universo, mas de uma maneira mais sagaz. Dividido em duas partes, o filme acompanha o casamento de Justine (Kirsten Dunst, genial), onde a mesma é tomada pela urgência da depressão, tendo de “enfrentar” os presentes, dentro de suas representações sociais. Essa primeira parte, revela um Trier inspirado, misturando autoreferências (Dogma 95?) com estéticas das mais tradicionais cinematografias européias. Ali ele acampa sua conhecida criticidade humana, capitalista e, por que não? misantrópica, mas numa “embalagem” tão envolvente, que nos perguntamos se a depressão de Justine é um personagem ou um elemento daquilo que Trier que evocar.

Na segunda parte do filme, vemos o ápice da expressão que o título do filme procura representar. O confronto psíquico entre Justine e a irmã Claire (Charlotte Gainsbourg, que está se especializando em compreender a aritmética cênica de Lars) dá margem para muitas interpretações e, principalmente para ligarmos o processo depressivo do próprio cineasta com a história que quer contar. A teoria do caos anunciado que toma conta de todo esse ato rende momentos de pura poesia, o que não deixa de ser um paradoxo, indo até o clímax final, que diz muito sobre quem ou o que é a polêmica persona de Lars Von Trier.

Daí, diferentemente do que o júri de Cannes atestou (sendo influenciado pelo circo de Trier ou não), eu fico com Melancolia. Muito pela forma complexa mas nada prolixa de expressar um estado de espírito, e nos deixar cabreiros por isso…

A Árvore da Vida [xrr rating=3,5/5]
Melancolia [xrr rating=4,5/5]

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

7 thoughts on “A prolixidade de Malick e a psicanálise de Lars Von Trier

  1. · 7 de setembro de 2011 at 15:39

    acabei de ler o livro como a geração sexo drogas e rock n roll salvou hollywood e o argumento que o cinema esta em crise ja era muito presente na decada de 60 para 70,mesmo assim não se deixou de fazer obras importantes ao longo das decadas ,malick é um dos poucos sobreviventes dessa geração que conseguiu preservar sua visão artistica e autoral ,a arvore da vida é uma obra complexa e abrangente que tenta localizar o ser humano dentro da evolução do milagre que é a vida ,para isso o autor lança mão de conceitos evolucionistas e criacionistas tão antagonicos entre si com a plena consciencia que nada é comprovadamente verdade ,só a esperiencia da finita vida humana, dai o seu acerto ,a arvore da vida é um filme de multiplas camadas que diz alguma coisa tanto para crentes em um unico criador de tudo ,quanto para ateus praticos que reza pela cartilha da ciencia ,acredite só autores de grande estatura que consegue isso,lar von trier é um polemista depressivo que usa isso em prol de sua obra e justamente por isso suas obras perde o alcance tão comum para malick .

  2. Essa é a prova de que tudo é uma questão de ponto de vista, mas é interessante notar que para desmerecer a obra de Lars Von Trier você citou características pessoais dele e não de sua obra. Assim, nem precisa-se de contra-argumentação…

  3. · 8 de setembro de 2011 at 11:06

    na realidade usei apenas suas declarações publicas que sempre associa seu estado emocional com o enredo de seus filmes ,e de forma alguma usei isso para reduzir sua obra ,apenas gostei de seu artigo e quis fazer um comentario,não precisa ficar na defensiva

  4. Acho que fui mal interpretado. Não existe defensiva… O filme não é meu, tanto que começo a tréplica com “Essa é a prova de que tudo é uma questão de ponto de vista”. Mas normal, no terreno das ideias os conflitos são enriquecedores… Ops, muito prazer!

  5. · 12 de setembro de 2011 at 16:56

    I carinha relaxa ,arte é arte e quando ela é boa se assemelha a uma grande rampa com milhares de degraus ,voce só vai até onde o folego alcança

  6. Disse tudo… embora subjetividade e fôlego sejam metáforas bem canhestras… Mas por que não, né? Abração!!!

  7. · 14 de setembro de 2011 at 11:48

    ahahahahahahahahhahah gostei de voce cara